A propósito dos incidentes ocorridos no Dragão Caixa, no recente jogo final do playoff da Liga de basquetebol, vieram alguns dos moralistas do costume botar faladura, inicialmente, até sem saberem exactamente do que falavam.
Nem tal é preciso. Como é tradicional, fazem-no, escudados no maniqueísmo primário, tão do agrado dos adeptos do seu clube. O Bem vs. Mal, em que os lados estão perfeitamente definidos, e adivinhem quem está de que lado?
Ao Bem, tudo se perdoa, pois se dali algo menos digno emana, é por provocação do Mal.
Acham o comportamento do Carlos Lisboa lamentável, mas, ainda assim, quiçá por desconhecimento da sua prévia existência, ou apenas para atirar paralelepípedos aos olhos dos outros, permanecem na vã esperança que o dito se digne a facultar uma explicação plausível, que desdiga o que disse, e obviamente, desculpabilize a sua atitude, pois tonto é que não é.
Do lado do Mal, estão os tontos, os grunhos, a barbárie, pois mesmo quando provocados, são incapazes de revelar capacidade de “encaixe”. A mesma que aquele treinador reclama dos outros, dizendo que, na derrota, «[é] preciso saber “encaixar”», quando ele próprio, a ser verdade o que li num comentário, não a terá em abundância suficiente para suportar uma piada sobre o seu futuro profissional, e reagiu como se viu.
Reagiram mal e exageradamente os adeptos? Sim, é verdade. O que é engraçado é, como em tão pouco, apenas naquela resposta do treinador e no texto a que vai dar a ligação acima, tanto se revela do “ser benfiquista”.
A mesma puta da mesma superioridade moral do costume. A facilidade em julgar os outros pelos seus parâmetros, e paradoxalmente, a usual incapacidade de olhar para o próprio umbigo, à volta do qual, afinal de contas, tudo gira.
Aquele texto recordou-me de algo que comecei a escrever antes da interrupção ocorrida na actividade deste espaço, entre Maio e Dezembro do ano passado.
Na altura, num momento convulsivo da temporada, comecei a escrever para que as Putas das Virgens Puras não encolhessem os ombros e viessem dizer que não viram, não ouviram e não sabem de nada. Era suposto ser uma trilogia, como qualquer obra que se quer credível, mas ficou inacabada (caso interessem, ficam as ligações para a Parte I e a Parte II).
Para a terminar, faltou uma história, contada parcialmente na primeira pessoa, que poderá contribuir para o enriquecimento cultural, dos que tiverem suficiente abertura de espírito para a compreender.
Na cidade de Faro cada um dos três maiores clubes nacionais tem a sua filial. O Sporting Clube Farense, o mais proeminente e mais representativo, como o próprio nome indica, é filial do Sporting Clube de Portugal. A filial do Futebol Clube do Porto é o Futebol Clube de São Luís, e a do outro clube, o Sport Faro e Benfica, que merece toda a minha consideração, e daí aqui constar o nome por completo.
O São Luís e o Faro e Benfica, como são vulgarmente denominados, são clubes de bairro, que não sei se alguma vez terão ido além dos campeonatos distritais, e se alguma relevância têm, será ao nível das camadas jovens e do desporto amador.
É claro que, dada a dimensão dos três clubes, a maior parte dos farenses, onde eu me incluo, tem uma dupla paixão, por um dos clubes de Lisboa ou do Porto, e simultaneamente, independentemente da sua preferência nacional, pelo SC Farense.
Após esta breve introdução, direi que em todos os anos que vi futebol no velhinho e hoje decrépito São Luís, sendo o mais imparcial que me é possível, nunca vi o SC Farense ser mais prejudicado contra um dos grandes do que com qualquer outro. Se alguma excepção houver, para pior, será talvez, precisamente em confrontos com a equipa da “casa-mãe”.
Assim sendo, a bipolarização por e anti, descrita por António Boronha no seu blog, e que aqui reproduzi, do ponto de vista de um qualquer farense sem outras preocupações clubísticas que não o SC Farense, não tem mais motivo plausível para existir que, eventualmente o distanciamento geográfico entre Faro e o Porto.
A que, entrando na parte que tem que ver com os clubes, acresce o facto de, como o próprio Boronha admitiu já por diversas vezes, o Farense ter sido, no decurso dos seus mandatos, um dos clubes beneficiados, por exemplo, pela política de cedência de jogadores do FC Porto.
Tudo somado, torna-se difícil compreender o porquê de, em praticamente todas as vindas a terras do sul, os autocarros portistas serem sistematicamente apedrejados.
Estes comentários, retirados da caixa respectiva do blog acima mencionando, a propósito de mais um apedrejamento, ocorrido aquando de uma visita do FC Porto ao São Luís, poderão, em parte, ajudar a compreender o estado de espírito reinante nesses dias:
Caso não chegue, convirá ainda ter em conta que a maior claque do Farense chama -se “Southside Boys”, e ostenta por sigla um orgulhoso duplo “S”. Eu não teria tanto orgulho nisso, mas isso sou eu que sou esquisito em rfelação a certas coisas.
Conhecem alguma outra claque cujo nome termina em “Boys”, e em cujo símbolo constem também duas letras iguais, no caso invertidas?
Exacto, é essa mesmo. A tal que é ilegal, e que tem uma arrecadaçãozinha no Estádio da Lucy, onde se encontram coisas interessantes. E porque é que há esta similitude entre as designações destas duas claques?
Quem não as conheça, poderá dizer: “Olha que coincidência engraçada!”
Quem conhece os seus elementos, trata alguns por tu desde os tempos de escola, sabe bem o porquê, e tem tudo a ver, claro está, com aquele ou aqueles, que são os clubes do seu coração.
Por isso, há um pequeno pormenor que é omitido naqueles comentários, e que eu também presenciei no dia em questão. O autocarro do FC Porto foi perseguido e apedrejado até à saída da cidade, quem o perseguiu e apedrejou trajava as camisolas alvi-negras da claque do Farense, só que, por baixo destas a cor era outra.
Isto vi eu, não foi preciso que alguém me viesse relatar. Mais tarde, preocupados com as eventuais consequências da situação, apareceram outros sócios do Farense a falar do sucedido, e do facto de o clube ir arcar com as responsabilidades dos actos de uns quantos energúmenos. Como penso que veio a suceder.
Portanto, pregadores da moral, dos bons costumes, da verdade desportiva e quejandos, deixem-se de tretas. Os Bons não estão todos de um só lado, nem os Maus do outro.
Foi feio o que aconteceu no Dragão Caixa? Pois foi. Não há violência boa e violência má, apenas violência condenável? Também é verdade, assim como a violência não pode servir de álibi para mais uma rodada da dita.
Porém, “antros”, no dizer do autor do texto que despoletou este meu longo desabafo, como o Dragão Caixa, há-os por todo lado, basta que neles se reúnam umas quantas dúzias de grunhos, sem que faça grande destrinça entre os que provocam e os que respondem desporporcionada e despropositadamente.
Apenas separo os que assim agiram porque, verdadeiramente se sentiram ofendidos por um grunho, daqueles, se é que os houve, por exemplo, no caso do Dragão Caixa, que apenas tinham por motivação obstar a que um adversário recebesse um título na sua casa.
Porque os grunhos, por muito que custe a alguns aceitar, são de todas as cores (clubísticas).
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