Depois do Bloco de Esquerda se preocupar com o reles piropo, do nosso lado são os assobios dos adeptos à sua própria equipa, que provocam casos sérios de urticária.
É uma temática interessante, especialmente porque, para além das vozes, muitas, críticas para com os assobiadores, poucas tentativas vi de procurar compreender, afinal de contas, porque diabos assobiam.
Paradigmático na procura de uma resposta, foi um dos comentadores do Porto Canal, não me recordo do seu nome, no pós-match da recente derrota com o Sporting.
Para ele, sendo certo que o (mau) futebol apresentado pela equipa não puxa pelos adeptos, estes também não incentivam a sua equipa. Antes pelo contrário, invectivam-na. Dizia ele, que lhe dava a impressão de que estes adeptos, que talvez se comportassem racionalmente durante a semana, deixando no ar a dúvida quanto a isso e dando-nos a boa notícia de que ele o fazia, pareciam aproveitar o fim de semana e os jogos de futebol para extravasar a sua irracionalidade, assobiando a equipa, que supostamente deveriam apoiar.
Ou seja, resume-se a situação a uma questão de quem nasceu primeiro, o ovo ou a galinha, que não tendo solução resolvida estará sempre, ou que a ter solução, será a saída mais fácil que é a irracionalidade dos adeptos.
É curto, e é o tipo de resposta simplificadora de que francamente, não gosto.
Julgo que não fujo muito à verdade se disser que na génese e crescimento do FC Porto moderno esteve uma forte identificação do clube com a cidade e a região, aliados numa luta, quero acreditar, mais contra a centralidade da capital do que contra o sul no seu todo.
Simultâneamente houve uma profunda identificação dos adeptos com o repto lançado pelo clube, e não só. Identificaram-se facilmente também com alguns jogadores, oriundos alguns deles dos mesmos lugares que eles próprios, com os quais estabeleciam sem dificuldade laços de grande afinidade, e cujo comportamento em campo, no fundo replicava a sua própria postura perante o desafio lançado e a vida - os chamados jogadores à Porto.
No entanto, assobios sempre os terá havido, e se alguns jogadores mal mijavam fora do penico se sujeitavam à assobiadela geral, outros podiam executar perfeitas obras de arte pelas paredes, sem que mal algum os afligisse.
Por muito que custe, este FC Porto, de Pinto da Costa, meu e de, quero crer, ainda muitos outros portistas, como todas as coisas vivas, nasceu, cresceu e morreu.
O FC Porto pós-moderno dos dias de hoje, sen que isto seja necessariamente uma crítica, é um entreposto de jogadores. É a fórmula, que nos garantem sem grande hipótese de refutação, que assegurará a sobrevivência do clube e a continuação na senda da conquista. Mais do que recorrer a fundos de jogadores, o clube transformou-se ele próprio num fundo de jogadores.
Nos tempos que correm, em que todo o cuidado com os produtos tóxicos oferecidos pelas instituições financeiras, é pouco, o investimento em jogadores com a chancela #SomosPorto, garante, para gáudio de alguns portistas, conforme já li, e dos investidores, um retorno garantido, inclusivamente superior ao que se poderia obter por outras vias.
Em nome deste FC Porto as referências com que os adeptos contavam no terreno de jogo, os jogadores com os quais se identificavam, foram progressivamente e menos paulatinamente do que, confesso, me agrada, sendo-lhes retiradas.
Em troca, o que é que o clube, a SAD, a direcção, deram aos seus adeptos? Vitórias atrás de vitórias. Os jogadores à Porto, que dentro do campo eram os elementos de referência dos adeptos foram sendo despachados para a Turquia, para os Rio Aves, Estoris e para a equipa B:
"estes até são bons rapazes, mas estes que aí vêm são melhores, alguns deles são mesmo vedetas internacionais, e assim vamos continuar a ganhar"
Ora, sendo esta a oferta, quando as vitórias não aparecem, os adeptos olham para o relvado e não encontram alguém que colha a sua especial simpatia, mas apenas camisolas azuis e brancas.
É como dizia o Rui Veloso: "O prometido é devido", e claro está, cai-lhes mal. É natural, e daí ao assobio é um vê-se-te-avias.
O seu comportamento tem muito de pavloviano, ainda que involuntariamente induzido. Foram condicionados para reagirem positivamente às vitórias, e fazem-no, da mesma forma que reagem pela inversa às derrotas.
O futebol ainda é um jogo de homens (e mulheres) para homens (e mulheres), a experiência diz-me que tendemos a ser mais condescententes para com aqueles com os quais estabelecemos laços de alguma afectividade: "Quem para louvar a noiva, senão o noivo?"
É irracional? Talvez. Mas o que é que será mais irracional, este tipo de comportamento, ou o acreditar que, porque nos últimos 30 e tal anos as coisas correram maioritariamente pelo melhor, o mesmo irá forçosamente novamente acontecer?
Isso é pura fé. Há algo mais irracional do que do que a fé?
Por tudo isto, talvez não fosse pedir muito que o Porto Canal, obviamente sem abdicar da sua linha editorial, em vez de nos presentear com boas novas sobre a racionalidade do(s) seu(s) comentador(es), pudesse incluir na sua grelha de programas, qualquer coisa que promovesse a aproximação entre os adeptos e os jogadores do clube.
Será que jogadores como o Tello, vindo do Barcelona, ou o Óliver do Atlético de Madrid, habituados a lidar com o todo-poderoso e omnipresente Real Madrid, não terão alguma coisa interessante para dizer, com que os adeptos do FC Porto possam estabelecer um paralelismo?
Ou o Brahimi? Ou o Maicon, que já por cá anda há uns anos?
Bem sei que há a revista, há as redes sociais, e tudo isso, mas decididamente, não chega. Este tipo de intervenção está vedado ao Porto Canal?
Posso estar enganado, e certamente até estarei, mas parece-me que os laços afectivos e a identificação que, sem censuras, se estabelecerem entre os adeptos e os jogadores, terão um efeito bem mais duradouro do que campanhas, que por muito bem gizadas que sejam, à primeira derrota se irão.
. Coisas diferentes, talvez...
. Quando uma coisa é uma co...
. O acordo necessário e a n...
. FC Porto 2016/2017 - Take...
. A quimera táctica do FC P...
. No news is bad news, (som...