“Nas palavras de Vítor Pereira, o FC Porto fez um jogo «consistente» contra o Paços de Ferreira. O Dicionário da Língua Portuguesa da Porto Editora ajuda-nos a perceber exactamente o que quis dizer o treinador portista: por «consistente» entende-se aquilo que é sólido, credível, estável. De facto e olhando o jogo, vencer por 2-0 é credível, sem que o adversário crie uma ocasião de golo é sólido e sem grandes sobressaltos é estável. E, todavia…todavia essa consistência tão cara a Vítor Pereira é uma moeda de duas faces. Na face vista na [Cesta do Pão], ela resultou na melhor estratégia aplicável ao adversário e na melhor tendo em conta os condicionalismos próprios (ausências de James e Atsu). A estratégia de posse de bola, domínio de meio-campo e solidez defensiva, manietou o futebol de cavalgada do [outro lado] e produziu um jogo em que o empate foi o menor dos benefícios colhidos. Mas é forçoso reconhecer que, como dizia um benfiquista, o FC Porto de meia oportunidade fez dois golos embora o [outro], recheado de soluções ofensivas alternativas, só tenha tido mais uma oportunidade.
Mas, para receber em casa um Paços de Ferreira, que de antemão se sabia que iria jogar fechado e organizado atrás, é óbvio que a mesma estratégia de «consistência» arriscava-se a produzir o que se viu: um jogo tão lento, tão aborrecido, tão falho de interesse que às tantas a câmara da televisão até surpreendeu um jogador do Paços bocejando de sono. E um jogo que o FC Porto só desatou e venceu graças a um pontapé feliz e à total ausência de capacidade ofensiva do adversário”.
(Miguel Sousa Tavares, “Consistência: Virtudes e fraquezas”, sacado, com a devida vénia, daqui)
“Não vale a pena falar do árbitro do jogo com o [outro lado]. Já era expectável. Depois de andarem um ano a lamentarem-se de um alegado fora-de-jogo de Maicon, num lance que só viram na televisão, e depois de Pedro Proença ter pedido ridículas desculpas ao [outro lado], sabia-se que o árbitro deste jogo ia comportar-se desta maneira.
Os foras-de-jogo mal assinalados, mais a expulsões que não aconteceram já estavam no programa das expectativas para este jogo. O que não estava no programa para muitos foi aquilo que ninguém quer ver nem assimilar: o FC Porto é uma equipa de Champions, é mais forte, mais competente, mais consistente e a melhor do campeonato.
O jogo na [Cesta do Pão] foi só mais um exemplo, porque infelizmente é sempre preciso o Futebol Clube do Porto defrontar o [outro lado] na [Cesta do Pão] para dizer que a diferença é grande. Ainda assim, a dificuldade é imensa, pois agora a ideia que passam já não é que o [outro lado] é a melhor equipa mas sim que foi um jogo entre as duas melhores equipas do campeonato.
Foi, sem dúvida que o foi; só que uma, o FC Porto, como tem demonstrado sempre, é melhor que a outra, (...) - que mostra todo o seu poderio frente a equipas mais fracas, e toda a sua fragilidade frente aos mais fortes.
A forma como tentaram mascarar uma evidência foi a mesma que utilizaram quando o Barcelona foi [à Cesta do Pão] e fez uma das exibições mais humilhantes de que há memória para um adversário. Essa incapacidade do [outro lado] que ficou plasmada num jogo absolutamente humilhante foi depois mascarada com a genialidade de Messi e companheiros. Lembro-me bem do tom cândido com que o técnico do [outro lado] falou e de como a imprensa no dia seguinte se referiu a «extraterrestres», como se não fosse possível perder com o Barcelona de forma mais digna.
Ontem, o FC Porto só não ganhou o jogo, para lá do árbitro, porque não tinha soluções no banco para lançar no campo. As lesões de alguns jogadores condicionaram as opções de Vítor Pereira.
De resto, se fosse ao contrário e perante o que se viu, teríamos toda a imprensa a falar da genialidade [do Prof. Doutor Rei da Chuinga] e o próprio a enaltecer os seus méritos. Ora, como se viu, o FC Porto dominou, jogou melhor, deu um banho de bola e humildade ao [outro lado] e Vítor Pereira, como sempre tem acontecido, revelou ser mais capaz e mais competente, apesar de não ter contado com os mesmos recursos.
Curiosos, de facto, foram os comentários ao jogo. Reconheceram erros grosseiros, mas que não influenciaram o resultado. Reconheceram incapacidade do [outro lado] em jogar, mas adiantaram que o empate era justo porque o jogo foi equilibrado. Alguns tiraram o chapéu [ao Prof. Doutor Rei da Chuinga], porque enalteceu o grande jogo a que se assistiu, quando todos viram que o [outro lado] pouco ou nada fez porque a outra equipa foi mais forte, mesmo estando diminuída nas suas opções.
O que fica do jogo é que este [adversário] e toda a imprensa vão ter de baixar a guarda porque no Porto mora uma equipa mais forte”.
(Júlio Magalhães, “Baixar a guarda”, tirado daqui)
“[O outro lado] faz de cada posse de bola um ataque, o FC Porto quase faz de cada ataque uma posse de bola. O [outro lado] só se sente confortável quando domina, o FC Porto sente-se sempre cómodo quando controla, mesmo não dominando.
Nestes jogos, o FC Porto é mais igual a si próprio, o seu modelo não é tão arrasador contra equipas mais pequenas mas, pelo equilíbrio, adapta-se facilmente a jogos de maior exigência. O [outro lado] sai da zona de conforto quando não tem a iniciativa permanente e os jogadores acusam a mudança de chip se lhes pede que reparem na cara do adversário, para "marcar" Xavi ou Messi, Moutinho ou Lucho, habituados que estão a ignorar anónimos do Moreirense ou do Olhanense. Em suma, o FC Porto mantém o modelo, os princípios de jogo, mesmo quando altera o sistema, enquanto o [outro lado] mantém o sistema mas acaba, forçado ou deliberado, a jogar segundo princípios diferentes”.
(Carlos Daniel, não sei onde o disse ou escreveu, mas encontrei-o aqui)
Três visões sobre uma única realidade. Dois portistas, um benfiquista. Miguel Sousa Tavares, como todos sabem, um portista contra a corrente que, como tantos outros não nutre uma especial simpatia pelo nosso treinador e pelas suas opções técnico-tácticas.
Outro portista, Júlio Magalhães, que, nem por isso. E Carlos Daniel, benfiquista, e por isso, com o foco da análise a incidir fundamentalmente sobre o seu clube.
Independentemente da cor e do fervor clubístico de cada um, as suas análises convergem essencialmente para dois pontos: a equipa do FC Porto é mais talhada para os desafios internacionais, para a Champions, e para defrontar grandes equipas, que para os triviais feudos entre portas.
O nosso principal rival, pelo contrário, extasia-se a espezinhar e massacrar compulsivamente aves e outros animaizinhos inocentes, sem que a PETA se meta ao barulho. Quando apanha com outro tipo de oponentes, daqueles assim mais à séria, e que não se acagaçam com a cor das camisolas, a coisa fia mais fino.
Além disso, tanto uns como outros revelam uma incapacidade gritante de mudar agulhas ou de "chip", como diz o Carlos Daniel, sempre que lhes calha em sorte um adversário que, azar dos azares, escapa ao padrão para que estão formatados.
Mal de mim, que critiquei o Vítor Pereira por se atirar ao Manchester City, de peito aberto, censurá-lo agora por adoptar uma postura mais cautelosa e à base de caldos de galináceo, quando defronta equipas de uma bitola mais elevada.
Desde a pré-época que noto que a consistência defensiva é a pedra-de-toque desta equipa, e entendo como perfeitamente normal que a aposta do clube e/ou do treinador privilegie a participação europeia, depois do fracasso, não há que esquecê-lo, que foi a temporada passada nesse particular.
Por cá, como dizia o Mourinho, é q.b. ganhar nos sítios certos, nos momentos certos, sem confiar, como diz o outro, “que mais tarde ou mais cedo os golos vão aparecer”.
O que continuo a criticar é a ausência de um plano B, que permita a tal mudança de agulha, quando as coisas estão mais complicadas. Mas, da maneira como as coisas estão em matéria de opções (e estão a ficar mais desanuviadas, como se viu contra o Paços de Ferreira), demo-nos por felizes quando o plano A corre conforme o delineado.
Àquilo que aqueles ilustres escreveram, daria apenas uma achega da minha lavra, que pomposamente denomino de “teoria da pica”.
Quantos dos nossos jogadores ainda não foram campeões nacionais? Muito poucos. A grande parte até são bicampeões nacionais.
Quantos dos nossos jogadores ainda não contam no seu palmarés com pelo menos, uma vitória que seja sobre o nosso principal adversário? Idem, aspas, aspas.
Do outro lado, quantos podem dizer o mesmo? Quantos foram campeões e quantos nos derrotaram? Não sei de cor, nem vou procurar, mas não devem ser muitos.
Ou seja, para os nossos jogadores, aquilo que lhes dá verdadeiramente “pica”, é derrotar o nosso rival. Quando isso acontece na sua própria Cesta, tanto melhor. Quando a vitória na partida, coincide com o triunfo no campeonato, ui, ui. E quando, ainda por cima, apagam a luz e ligam a rega, para abrilhantar a coisa, é ouro sobre azul e branco.
O resto, bem, o resto é uma sensaboria total. É tão somente o caminho que se calcorreia para chegar à explosão suprema de alegria, que é e será sempre o primeiro lugar. Uma chatice, assim como para os miúdos, a sopa antes do segundo prato, e este antes da sobremesa.
Para eles não. Cada instante que passam na nossa dianteira, é um momento raro de triunfo que saboreiam até ao tutano. Por isso empenham-se ao máximo, e isso vê-se em cada golo que marcam e cada oponente que esmagam. Nós também lá estamos presentes.
O texto do Júlio Magalhães, de certa forma, reflecte este meu delírio teórico. A superioridade acaba, paradoxalmente, por se revelar um dos nossos maiores problemas.
Especialmente quando nos falha a motivação, e esquecemos que a sua demonstração tem que ser sistematicamente renovada, oportunamente e em sede própria. Por outras palavras, a cada partida e no terreno de jogo, qualquer que seja a cor, dimensão ou formato do adversário a vencer.
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